Arcos Principais: Pesadelos (Knightmares).
Publicação Original: Batman #61-63 e #66-69 (DC, 2019).
Roteiro/ Arte: Tom King/ Travis Moore, Mitch Gerads, Mikel Janin, Jorge Fornés, Lee Weeks, Amanda Conner e Yanick Paquette.
“Pesadelos” é um arco longo com 7 edições e que ocorre quase que inteiramente na mente do Batman, com diversos devaneios, medos e angústias sendo expostos e explorados pelo autor Tom King (O Visão e Senhor Milagre). Com ar de antologia, cada edição conta com uma equipe diferente de artistas, resultando num arco com sete histórias curtas. E como na maioria de volumes assim, tem suas histórias boas e outras nem tanto. Review especial com alguns spoilers de Pesadelos!
PESADELOS
Aparentemente o Batman está preso em algum lugar de Gotham, sendo exposto talvez à toxina do medo do Espantalho, mergulhado em seus próprios pesadelos. Cada edição desse arco traz um artista diferente e foca num determinado ponto da mente e personalidade do herói, rendendo diversas participações especiais. Claro que todas elas são fruto da sua própria consciência, uma maneira de tentar lidar e vencer o gás do medo. Dessa forma, temos a presença de Damian (seu filho), Coringa (seu maior inimigo) e a Mulher-Gato (sua paixão), entre outros que ajudam a consolidar sua personalidade. Nesse ponto o arco vale bem a pena, mas por outro lado há algumas histórias razoáveis e diálogos/ recordatórios infinitos em algumas cenas. Assim como Tom King sempre capricha na subjetividade, de vez em quando ele escreve muito (literalmente), cansando um pouco.
A primeira história envolve o vilão mirim Patrão Bruce, representando talvez o medo do Bruce Wayne em pensar no que teria se transformado se não optasse pelo combate ao crime. Num outro pesadelo, temos o vilão Professor Porko torturando o Batman num matadouro, cercado de porcos mortos e pendurados, além de muito sangue. Essa edição possui arte do sempre incrível Mitch Gerads, trazendo um traço e cores mais estilizados que o de costume, gerando um acabamento gráfico muito bom. Inclusive o Porko não é muito utilizado nos quadrinhos, aparecendo pouco, então vale a participação (mesmo que seja uma projeção do inconsciente do Morcego). E nesse ponto, a figura por trás de Porko é o que impressiona, pois demonstra qual é a fraqueza do próprio Batman.
O terceiro capítulo se chama “Fumaça e Espelhos” e traz o mago John Constantine tentando avisar o Batman, que segue em combate ao crime ao lado da Mulher-Gato, que tudo não passa de um sonho. O leitor fica na dúvida se o Constantine é real ou também fruto do inconsciente de Bruce. Um ponto interessante é que Neil Gaiman, o autor que criou o universo de sonhos do Sandman que conhecemos hoje, possui um livro de 1998 chamado Fumaça e Espelhos. Não acredito em coincidências e, por se tratar de sonhos e também da DC (detentora do Sandman), acho que coube uma homenagem.
A edição #66 traz desenhos de Jorge Fornés e cores de Dave Stewart numa trama de mistério, quase um jogo de perguntas e respostas, onde a Mulher-Gato é interrogada pelo detetive Questão. O traço de Fornés é muito bonito, dando um ar noir e sexy à situação. Nessa edição que a gente percebe o quanto Tom King pode se estender nos diálogos e caixas de textos, me lembrando um pouco do Chris Claremont nos X-Men do começo dos anos 2000. Não chega a ser chato como era nos X-Treme X-Men, mas cansa um pouco. E o interessante dessa edição é reforçar a ideia de que o Bruce só consegue ser o Batman estando longe de um laço amoroso, pelo menos o inconsciente dele vê dessa forma. E claro, há uma ótima metalinguagem entre o Questão e a Gata.
Dessa metade pra frente o arco perde um pouco o fôlego. Será que precisava mesmo de 7 edições? A gente começa a se perguntar. A edição #67, por exemplo, traz uma história praticamente muda (talvez pra compensar a anterior), com o Batman numa perseguição sem fim de um homem mascarado. Apesar da história aparentemente simples, Lee Weeks se une a Jorge Fornés na arte, junto das cores de Lovern Kindzierski, gerando uma aventura recheada de onomatopeias e uma ótima sequência de ação, os dois pulando de telhado em telhado, descendo por escadas sem fim de prédios, uma boa representação dessa perseguição onírica infinita. Já a edição #68 é um tanto bobinha, trazendo a Lois Lane e a Selina Kyle numa despedida de solteira na Fortaleza da Solidão, curtindo a vida muito bêbadas. Enquanto o Bruce janta com o Clark Kent, tentando puxar algum assunto naqueles silêncios constrangedores.
“Pesadelos” finaliza com uma história que mais levanta perguntas do que apresenta respostas. A mente do Batman vem seguindo por todos esses sonhos na tentativa de “acordar“, enfrentando seu último estágio: a Mulher-Gato. Nessa altura do campeonato, eu pelo menos, já to meio de saco cheio desse jogo entre os dois pombinhos. Foram 50 edições aquecendo o casamento entre eles, pra depois não dar certo, mas continuam arrastando isso. Assim como a situação entre o Bane e o Batman, que protagonizou os primeiros arcos dessa fase do Tom King e que agora retorna. Então fica aquela vontade de ver temas mais diferentes, fugindo um pouco dessa galeria de cartas marcadas, mas no geral Pesadelos é um arco interessante, que explora as várias facetas do Batman e traz uma equipe de ótimos artistas.
Fil Felix é ilustrador e escritor. Criador dos conceitos e personagens do universo da Central dos Sonhos. Fã de HQs, gosta de escrever reviews desde 2011, totalizando mais de 600 delas em 2023. Já escreveu sobre arte para diversos blogs como Os Imaginários e a Coluna Asas da editora Caligo. Ilustrou seu primeiro livro infantil em 2021: Zumi Barreshti, da editora Palco das Letras.