[Review] X-Men: Dinastia X/ Potências de X!

Arcos Principais: Dinastia X (House of X) e Potências de X (Powers of X).
Publicação Original: House of X #1-6 e Powers of X #1-6 (Marvel, 2019).
Roteiro/ Arte: Jonathan Hickman/ Pepe Larraz, .R B. Silva.

Dinastia X e Potências de X (no original em inglês House of X e Powers of X, respectivamente) foram duas revistas publicadas em 2019 e que marcaram uma espécie de renascimento para a franquia dos X-Men nos quadrinhos, trazendo novos conceitos e uma proposta bastante ousada envolvendo a ilha mutante Krakoa, que certamente entrará nos momentos mais marcantes da trajetória dos mutantes. Apesar de levarem nomes diferentes, as revistas funcionam em conjunto, pois a história de Dinastia X #1, por exemplo, continua diretamente em Potências de X #1 e assim por diante, intercalando uma e outra, totalizando 12 edições. Também é o início da fase atual dos X-Men nos quadrinhos (e que finalmente cheguei!). Review especial com spoilers e por tópicos!

DINASTIA X/ POTÊNCIAS DE X: A HISTÓRIA ATÉ AQUI

Antes de comentar a história em si, acredito ser interessante trazer um contexto geral das revistas X nos últimos 20 anos. Em 2001, por exemplo, cerca de 15 milhões de mutantes foram mortos no arco E de Extinção, escrito pelo Grant Morrison, quando Cassandra Nova liderou um ataque à nação mutante Genosha. Anos depois, em 2005, os mutantes recebem outra baixa: a Feiticeira Escarlate, fora de controle, alterou a realidade e eliminou o gene X de milhares de mutantes na saga Dinastia M, escrita pelo Brian Michael Bendis. A população mutante foi rebaixada a cerca de 200 indivíduos e com nenhuma criança nascendo com o gene X nos anos seguintes. Dessa forma, a mutandade foi reconhecida como espécie em extinção e praticamente todas as histórias da década seguinte retratou esse dilema.

E mesmo desfalcados, os X-Men entraram em conflito com os Vingadores na controversa saga X-Men Vs Vingadores de 2012, também escrita pelo Bendis, quando o Ciclope acreditava que a iminente chegada da Fênix na Terra poderia finalmente despertar o gene X, enquanto o lado do Capitão América acreditava que isso traria o fim dos humanos. É nessa saga que o Professor Xavier é morto, diga-se de passagem. E desde então os X-Men enfrentaram uma crise nos quadrinhos, com histórias medianas e tantas outras bem ruins. Muitos acreditam que a Marvel simplesmente abandonou os mutantes, já que não poderiam usá-los no cinema (por terem os direitos reservados à FOX). Em 2017, numa outra mega-saga, foi a vez dos mutantes enfrentarem a família real dos Inumanos em X-Men Vs Inumanos, escrito pela dupla Jeff Lemire e Charles Soule. O motivo do embate: a sagrada nuvem terrígena dos Inumanos, espalhada pela atmosfera da Terra, demonstrou ser fatal em contato com algum mutante. Além de mais um golpe contra a mutandade, o Ciclope é morto. Ou seja, saga após saga os mutantes foram sendo colocados de escanteio, perdendo personagens importantes, mas… coincidentemente ou não… em 2019, mesmo ano que a Disney finalizava a compra de toda a FOX, estando agora apta a utilizar os X-Men (e outros heróis, como o Quarteto Fantástico) em seu Universo Cinematográfico, tivemos o lançamento de Dinastia X/ Potências de X. Além de marcar um recomeço para os X-Men, essas revistas praticamente ignoraram muitos acontecimentos recentes nas histórias e trouxeram uma grandeza e um trato que há tempos não víamos com os mutantes. Um começo sensacional, eu diria!

MOIRA X!

Agora que já comentei o contexto, bora falar sobre a saga em si! De início, há uma diferença entre as duas revistas: Dinastia X foca em mostrar o presente, enquanto Potências de X aborda o passado (ano 1), o presente e o futuro em duas partes (ano 100 e ano 1000), com as histórias sendo mescladas eventualmente. Então, enquanto conhecemos o que está sendo feito atualmente em Krakoa, também temos vislumbres do que aguarda os mutantes nas eras futuras. E o fio condutor de tudo isso é a Moira MacTaggert, que morreu lá em 2001 no arco O Fim do Sonho, quando havia descoberto a cura para o vírus legado e foi morta pela Mística. Só que ela não morreu! O autor Jonathan Hickman reformulou toda a personagem, que agora é uma mutante, apelidada de Moira X, cujos poderes envolvem o renascimento: ao morrer, ela reencarna em seu próprio corpo e época originais, mas com as memórias das vidas anteriores. Sendo assim, em Potências de X, vemos a Moira morrendo e renascendo diversas vezes e, em cada renascimento, tentando mostrar ao Professor X como os mutantes são caçados, independente do que é feito e, mesmo assim, ela tenta bolar um plano diferente com ele toda vez.

Essa é uma das grandes mudanças apresentadas aqui, mexendo com tudo que sabíamos sobre a Moira e até mesmo dando um nó na nossa cabeça, já que o leitor precisa tentar encaixar os eventos passados com os atuais, tentando entender o que de fato aconteceu e o que permanece sendo verdade nessa linha do tempo. Ela não morreu, por exemplo, pelas mãos da Mística, mas sim forjou a própria morte e permaneceu escondida esse tempo todo. Um pouco confuso, né? Mas tudo isso é explicado no decorrer das 12 edições, só dei uma resumida aqui!

A ILHA-NAÇÃO KRAKOA!

A primeira edição já apresenta a ilha mutante Krakoa e todo o seu conceito e, mesmo com o leitor já pegando o bonde andando (tentando entender o que aconteceu entre a última história, Fabulosos X-Men: Sempre Fomos, e agora), tudo é muito grandioso e empolgante: uma excelente primeira edição. Krakoa consegue se expandir e formar habitats em qualquer lugar, perto ou longe do “corpo principal”, todos conectados por portais. Basta plantar uma flor-portal num determinado lugar para poder crescer ali um portal. O Professor X reuniu boa parte dos mutantes e transformou a Ilha numa nova nação, algo que já aconteceu antes em formatos diferentes, não é mesmo? Alguém se lembra de Genosha, Utopia…? O que mudou dessa vez? Agora, Charles está mais impetuoso que nunca, declarando soberania mutante sobre Krakoa e mandando um aviso para as outras nações: aceitem ou se tornem inimigos. E como moeda de troca para as nações que aceitarem a soberania de Krakoa, os mutantes doarão flores especiais que só nascem na ilha e que são capazes de curar diversas mazelas da humanidade. Sem dizer que ele está aceitando tanto heróis, quanto vilões na nação.

Nessa primeira edição, por exemplo, o Magneto apresenta a ilha para alguns diplomatas, colocando os mutantes como os novos deuses da Terra, mas que escolheram viver em paz em Krakoa, em vez de aniquilar os humanos. Também conhecemos uma das principais regras do lugar: somente mutantes são bem-vindos. E para dar mais corpo à ideia de nação, a ilha possui um idioma próprio que só os mutantes conhecem (e que foi ensinado telepaticamente para todos). E o Cifra é o grande tradutor e o único capaz de se comunicar diretamente com a ilha. Muita informação!

A ORQUÍDEA E OS PROTOCOLOS DE RESSURREIÇÃO

Logo no início, Charles reúne uma equipe para uma missão secreta: invadir o QG da organização anti-mutante Orquídea, localizada na órbita do Sol e que vem criando um Molde-Mãe, uma máquina capaz de criar vários Molde-Mestres (que, por sua vez, criam super-sentinelas. Ufa!). Na equipe temos membros como Ciclope, Monet, Noturno e a Mística. O engraçado é que o pessoal da Orquídea só detectam a presença dos X-Men pelo radar e já presumem o pior: que vieram para destruir tudo. Claro que eles tiveram razão nessa missão, mas não é algo que a equipe normalmente faz.

Cada membro precisa desativar um dos braços que segura a cabeça do Molde-Mãe, para que ele seja jogado em direção ao Sol. E todos acabam se suicidando ou sendo assassinado no caminho, mas a missão é finalizada e o Molde-Mãe destruído! Quando muitos personagens morrem assim tão facilmente, a gente já sabe que não deve ser levado tão a sério. E dito e feito: de volta à Krakoa, o Professor X nos apresenta os Protocolos de Ressurreição da ilha, realizados pelos Cinco! E com isso entramos numa das paradas mais bizarras que o Hickman criou, que é como o processo funciona. Primeiro que o Professor X possui um estoque do DNA de todos os mutantes, coletado e fornecido pelo Sr. Sinistro, e em sua nova versão do Cérebro, aprimorada pelo Forge e pela própria Krakoa, ele também tem um backup semanal do inconsciente de todos os mutantes. WTF? Bizarro, no mínimo.

Mas o pior (ou melhor, não sei), vem depois. Os Cinco utilizam desse DNA e do backup para realizar o procedimento de ressurreição, começando pelo Fabio Medina, que cria grandes bolas douradas que funcionam como ovos. Proteus distorce a realidade deles e deixa os ovos viáveis. Hope Summers injeta o DNA dentro do ovo, além de seus poderes amplificarem o dos demais. Elixir inicia o processo de replicação celular. E por último, Eva Bell acelera o tempo dentro dos ovos. Ao fim do processo, temos uma espécie de clone saindo dos ovos, já na fase adulta e com as memórias e emoções do último backup feito. Todos que morreram na missão perto do Sol são ressuscitados e os Cinco são tidos quase como santos pelos mutantes da Ilha. O plano de Xavier é, em algum momento, poder ressuscitar todos os mortos em tantas batalhas e genocídios anteriores.

Apesar do conceito ser muito interessante, principalmente porque Hickman está criando quase uma mitologia própria de Krakoa, eu não sou muito fã de mortes e renascimentos. Aliás, acho um porre. Mas da maneira como foi colocada, pode render boas histórias! Mas não deixa de ser bizarro, por exemplo, os ressuscitados caminharem pelados em meio à multidão, sendo adorados.

ANO 100, ANO 1000 E A 9ª VIDA DE MOIRA X

Outro ponto que é abordado em Dinastia X/ Potências de X é o futuro dos X-Men. Quer dizer, os inúmeros futuros que a Moira X presenciou. É uma parte que vai surgindo e ganhando corpo em meio à trama principal, mas confesso que tive certa dificuldade de entender bem os anos 100 e 1000. Em parte porque temos versões alternativas de personagens que já conhecemos e também por envolver uma intrincada teoria sobre inteligência artificial, Ninrod e a Falange. O principal a pegar aqui é a missão protagonizada por um Wolverine, Apocalipse e Cifra/ Krakoa do futuro que fazem de tudo para conseguirem informações extremamente importantes envolvendo os mutantes, repassando para a nona vida da Moira X. Com esse novo conhecimento, ela seria capaz de tentar salvar a humanidade uma vez mais.

Isso acaba se desenrolando para a realidade atual da ilha Krakoa, como o Professor X visitando o Sr. Sinistro no passado e pedindo para que ele coletasse o DNA dos mutantes, mas apagando esse pedido de sua mente logo em seguida. Vale comentar que o Sinistro está afetadíssimo! Já faz alguns anos que ele vem sendo retratado como um tirano louco, narcisista e que comanda um exército de copias de si mesmo. Nessa HQ ainda temos ele decidindo usar uma capa pela primeira vez, super dramático e afeminado. Antes ficava no ar a questão dele ser queer, mas acho que está mais evidente agora. E estou amando, deu maior carisma, vem se tornando um dos meus vilões preferidos. Também conhecemos como o Professor convenceu o Cifra de passar um ano em Krakoa, antes de todo mundo saber, para que a conhecesse e criasse um sistema de comunicação eficiente no lugar.

O CONSELHO SILENCIOSO E O JULGAMENTO DE DENTES-DE-SABRE

Um outro ponto que eu gostaria de comentar é o quanto Charles Xavier está diferente. Ele praticamente se transformou numa versão do Magneto. Ou seja, o Magneto realmente estava certo esse tempo todo? Eu diria que sim! As duas últimas edições, Potências de X #6 e Dinastia X #6, abordam essa questão e são grandiosas! Charles utiliza seu novo capacete energizado pela Krakoa e manda o recado para todos os humanos: “o tempo de vocês acabou, os mutantes são o próximo passo da evolução e tomaremos nosso lugar”. Ele chega a comentar que no passado teria entregado os medicamentos milagrosos de Krakoa de bom grado para a humanidade, mas agora eles serão barganhados.

E para manter a ordem na ilha, Charles também encabeça o Conselho Silencioso, um grupo composto por 12 mutantes que criarão e farão cumprir as leis krakoanas. O conselho é dividido em 4 grupos de 3 integrantes cada: Outono (Professor X, Magneto e Apocalipse), talvez com os mais poderosos; Inverno (Senhor Sinistro, Exodus e Mística), mantendo os encrenqueiros e idealistas unidos; Primavera (Sebastian Shaw e Emma Frost), tomado pelo Clube do Inferno, que também faz as transições de mercadoria entre as nações e que ainda possui uma cadeira vaga; e a mesa Verão (Tempestade, Jean Grey e Noturno), com alguns dos pupilos do Professor X. O Conselho ainda é assistido pela própria Krakoa e por Cifra. Além do Ciclope liderar o grupo dos Grandes Capitães: Górgon, Bishop e Magia.

E ao melhor estilo da Revolução dos Bichos, livro do George Orwell, o Conselho cria suas primeiras leis: não matar humanos; fazer mais mutantes; e reverenciar Krakoa, a terra sagrada. Quase bíblico, também! E com isso eles tanto protegem o lugar, quanto mantém a diplomacia com os humanos e ainda aumentam a população, principalmente através dos Protocolos de Ressurreição. Mas o mais impactante nessas últimas duas edições e, de novo, no melhor estilo da Revolução dos Bichos, é que há muitas brechas e perigos em tudo isso. A começar pelo primeiro julgamento, tido como exemplar, o do vilão Dentes-de-Sabre! Numa missão anterior, Victor se excedeu e acabou matando alguns humanos, ou seja, quebrando as regras que ainda viriam a ser criadas. Muito é debatido sobre a penitência que ele devia receber, principalmente porque prisões são proibidas em Krakoa e a pena de morte não teria efeito, já que ele entraria para os Protocolos. Resultado: exilado para o interior de Krakoa, colocado em estase (porém ainda consciente) para todo o sempre (ou quando mudarem de ideia). Quer dizer, que destino é esse? Pior foi ver a turma dos X-Men, em especial o Noturno (que já chegou a ser padre), votando a favor disso. Aliás, todos votaram! Pra mim, uma das cenas mais impactantes, pesada demais!

E logo em seguida, todos vão para a festa que está rolando na ilha, comemorando a soberania de Krakoa ao som da Cristal. Nas últimas cenas, Magneto e Xavier visitam a Moira X, que possui um habitat secreto na ilha e está escondida de todos, já que ainda é considerada morta e humana. Eles explicam à ela como reuniram os 12 membros e dão um destaque especial para a Mística, que é uma das minhas personagens preferidas: em troca dela participar do conselho, prometeram trazer a Sina (a mutante que previa o futuro e sua ex-esposa) de volta à vida. E então temos o plot twist: eles prometeram, porém não irão cumprir; pois videntes não podem entrar em Krakoa. Ninguém pode descobrir que Moira está viva ou que, independente do futuro, os mutantes sempre saem perdendo. Quer dizer, temos o primeiro indício de que, apesar de aparentemente perfeita, a nação de Krakoa esconde diversos segredos obscuros. De presos isolados à exclusão de mutantes, só mais um segredo para a lista já extensa do Professor X, não é mesmo?

Potências de X/ Dinastia de X fez um reviravolta na mitologia X, incluindo a ilha mutante Krakoa e criando quase um panteão para sustentar essa nova cultura, como o Conselho Silencioso, os Grandes Campeões e os Protocolos de Ressurreição. Ponto positivo para o roteirista Jonathan Hickman e os desenhistas Pepe Larraz e .R B. Silva, que arquitetaram tudo isso e colocaram os mutantes numa posição bem acima de onde eles estavam. Um começo um tanto confuso em algumas situações, principalmente as do futuro, mas no geral muito empolgante e emocionante. Fiquei passado com a situação da Sina e do Dentes-de-Sabre, por exemplo!

Obs: após Potências de X/ Dinastia de X, a Marvel passou a publicar 6 novas revistas X: X-Men, Carrascos, Excalibur, Novos Mutantes, X-Force e Fallen Angels. Meses depois, ela cancelou Fallen Angels e lançou mais 4 novas revistas: Wolverine, X-Factor, Cable e Satânicos. Ou seja, atualmente estão sendo lançadas cerca de 9 revistas X simultaneamente!

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