Arcos Principais: A Fúria do Cara-de-Barro (The Wrath of Clayface).
Publicação Original/ Brasil: Batman: The Dark Knight #22-25 e #23.3 (DC, 2013)/ Batman #22-23 e #27 (Panini, 2014).
Roteiro/ Arte: Gregg Hurwitz/ Alex Maleev.
O Batman provavelmente possui a melhor galeria de vilões dos quadrinhos, com alguns dos mais icônicos, como o Coringa ou o Pinguim. A Hera Venenosa é a minha preferida e recentemente acabei me apaixonando por outro de seus vilões: o Cara de Barro, ao ler a nova Detective Comics. Ele é tão interessante, com um ótimo background: Basil Karlo era um ator de cinema, utilizando de seus poderes para moldar a aparência, porém seu corpo ficou fora de controle e passou a se manter cada vez mais na forma de barro. Agora no Rebirth, o Batman o recrutou para o lado dos mocinhos. Mas antes disso, ele sempre foi um super vilão. E procurando outras histórias dele, já que curti bastante, me indicaram esse arco em quatro partes escrito pelo Gregg Hurwitz (Vengeance of the Moon Knight) e com os desenhos de Alex Maleev (Demolidor), publicada originalmente em Batman – O Cavaleiro das Trevas #22-25 dos Novos 52. Ou seja, não é muito antiga. Na história, Hurwitz recria a origem do personagem (possivelmente ainda válida) e o coloca no centro das atenções, ao explorar sua necessidade de ser notado pelo público. Muito boa! Review com alguns spoilers!
A FÚRIA DO CARA-DE-BARRO!
Na história, o Cara de Barro está roubando diversos lugares e, logo em seguida, matando os próprios capangas, chamando a atenção do Batman e do Comissário Gordon, que iniciam uma busca por ele. Além de forte, a natureza de seu corpo o deixa difícil de ser capturado, já que ele pode escapar pela mínima aresta de qualquer prisão, escorrendo. Mesmo assim, o Batman testa uma nova tecnologia que consegue aprisioná-lo como se fosse “a vácuo“. As edições #22 e #23 focam nessa captura, com o típico Batman agindo nas sombras, investigando e entrando em contato com pessoas que talvez saberiam lhe informar como capturar Basil, entre elas o Pinguim. A arte de Maleev, como de costume, é estilosa e ótima, com o bônus das cores de Dave McCaig (Batgirl Rebirth), que deixa tudo num tom mais “pastoso”, obscuro. Um ponto legal é que, logo no começo, o Alfred fala sobre como o Comissário é um dos aliados mais poderosos do Morcego, mesmo sem ter nenhum poder, pra não subestimá-lo.
Já as outras duas edições trazem meio que duas histórias fechadas, mas ainda dentro desse contexto. Na verdade essas 4 edições não formam bem um arco, já que não possui um nome oficial, mas seria um arco não oficial, com foco no Cara de Barro. A #24 é um flashback, como ele adquiriu seu poder. Basil Karlo era um aspirante a ator de cinema, fazendo inúmeras audições, mas indo bem em nenhuma. Ele era o garoto sem nada de especial, passando despercebido em todos os lugares. Mesmo quando se esforçava pra ser notado, ninguém dava bola. Como os selecionadores de uma audição comentam, ele não era bonito suficiente pra ser galã, nem estranho o suficiente pra chamar a atenção, era apenas “normal“. E foram essas frustrações que o levaram a pedir a ajuda do Pinguim, o grande magnata de Gotham, que prometeu a ele uma fórmula para se tornar famoso. Essa fórmula é o barro mágico que tomou conta de seu corpo. Interessante comentar que essa origem dos Novos 52 é diferente da origem “original”, onde Karlo já era um ator famosos antes de se tornar o vilão, ficando revoltado e louco ao saber que seria substituído num filme. Já aqui, ele usa as novas habilidades de manipulação corporal para se tornar uma pessoa nos moldes que Hollywood exigia, ficando famoso, antes de perder o controle.
O legal dessa origem e também o que faz o diferencial da maioria dos vilões do Batman, são as referências e contextos que cada um possui. A história de Basil Karlo não é muito diferente da de muitas pessoas: a sensação de inexistência, a vontade de ser notado, de se sentir especial. Um ritmo bastante depressivo, até. A última parte, na edição #24, já volta pro presente e o mostra no Arkham, após ser capturado. Mesmo sem contar com as outras três, essa em si é muito boa! Karlo descobre que o detento ao seu lado é um grande fã, passando dias conversando sobre os filmes de sua carreira, com direito a encenar discursos inteiros. Só que o inevitável acontece e Karlo surta, dando início a um plano maquiavélico, incluindo colocar o Pinguim (que sempre o chantageava) para fora do jogo. O Cara de Barro sequestra civis e os dopam com o gás do Coringa num teatro, onde planeja encenar para eles 24h por dia, 7 dias por semana, pra sempre. Uma plateia cativa pro resto de sua vida, o que tanto ansiava. As sequências são excelentes e, na verdade, todo esse arco poderia correr tendo esse argumento como pano de fundo. Mesmo assim, é um arco interessante por explorar o lado narcisista do vilão, em levantar questões que são sempre atuais, como a necessidade por atenção a todo custo. E a Detective Comics do Rebirth ainda faz um link com isso, já no primeiro arco, quando o Batman vai encontrá-lo num cinema, após ter fugido do Arkham. Ele só queria rever seu papel, lembrar de quando ainda era “humano” e bonito.
NÃO É SÓ MAIS UM ROSTO BONITINHO
Enquanto esse arco estava acontecendo, também tínhamos o evento Vilania Eterna da DC, com uma publicação especial para quase todos os principais vilões do UDC. E em Batman – O Cavaleiro das Trevas tivemos 4 desses especiais, sendo um (a edição #23.3) do Cara de Barro, coincidindo com o arco e intitulada Not Just Another Pretty Face. Nela, seguindo os eventos da Vilania Eterna, Karlo descobre que os heróis caíram e agora quem está no controle é a Sociedade Secreta de Super-Vilões, que recrutou alguns dos mais barra-pesadas do momento. O Cara de Barro, como de costume e devido sua auto-estima lá embaixo, não entende porque não foi convidado, decidindo fazer um grande crime pra chamar a atenção deles. É uma one-shot que dá o outro lado do personagem, que vimos pouco no arco, como seu temperamento explosivo e instável, seu narcisismo e, claro, sua necessidade de impressionar. Com roteiro de John Layman (Chew) e desenhos de Cliff Richards (Buffy), num tom cômico e descompromissado. Para os fãs do vilão, antigos ou novos como eu, recomendo a leitura dessas edições, que trazem questões psicológicas interessantes, apesar de demorar pra engatar e cair em clichês do gênero heroico em alguns momentos.
Fil Felix é autor, ilustrador e psicanalista. A Central dos Sonhos é seu universo particular, por onde aborda questões como memórias, desejos e infância. Fã de HQs, escreve seus comentários sobre quadrinhos desde 2011, totalizando mais de 600 reviews. Já escreveu sobre arte para diversos blogs como Os Imaginários e a coluna Asas da editora Caligo. Ilustrou os livros infantis Zumi Barreshti (2021, Palco das Letras) e Meu Avô Que Me Ensinou (Ases da Literatura), entre outras publicações.