Arcos Principais: Ano Um (Year One).
Publicação Original/ Brasil: Wonder Woman #2, #4, #6, #8, #10, #12 e #14 (DC, 2016)/ Mulher-Maravilha #2-8 (Panini, 2017).
Roteiro/ Arte: Greg Rucka/ Nicola Scott.
“Ano Um” é o segundo arco da Mulher-Maravilha nesse Rebirth da DC. Como comentei no review do primeiro (As Mentiras), o roteirista Greg Rucka (Wolverine, Elektra) optou por um modelo diferente de desenvolver a série: as edições ímpares ocorrem no presente, enquanto as pares são no passado; e assim corre com dois arcos simultâneos. Enquanto em As Mentiras tivemos uma contextualização da Diana nessa nova fase, sem saber como encontrar Themyscira e apresentando suas principais características, em Ano Um a pegada é semelhante: contar toda a origem da heroína; desde a chegada de Steve Trevor na Ilha das Amazonas, sua mudança pro mundo dos homens, como ganhou seus poderes e como conheceu Barbara Ann Minerva e Etta Candy, que mais tarde se tornariam a Mulher-Leopardo e sua melhor amiga, respectivamente. Apesar de não mostrar nada muito novo no fronte, é uma boa leitura! Review sem spoilers!
ANO UM
A DC tem o costume de recontar o primeiro ano de atividade de alguns de seus heróis, a famosa “Origem”, sob o título “Ano Um“. Já teve vários especiais, minis e arcos com esse título. E aqui não é diferente, se chama assim porque reconta a origem da personagem. Um ponto interessante é que, desde os Novos 52, a DC também está realocando essas origens num tempo mais recente, ou seja, como se tivessem ocorrido nos anos 2000. Sendo assim, não estranhe ver celulares nesse arco. Se isso gera um conflito com o que já foi mostrado nas décadas passadas, aí é outra questão! O arco começa com cenas em paralelo, mostrando o dia a dia de Steve no exército e da Diana com as amazonas. Não demora muito para que Steve e seu grupo de soldados entrem numa missão, a de desmascarar o grupo SEAR, e acabam com o avião caindo em Themyscira, gerando um reboliço. Homens não frequentam a Ilha, que é formada apenas por mulheres. Muitas delas, inclusive, nunca viram um. Isso é explicado por elas terem uma certa imortalidade, por isso também não há crianças com frequência. E do acidente, Steve é o único sobrevivente. As amazonas cuidam dele, velam os mortos e reconstroem o avião.
O contato com a Diana surge quando elas criam um campeonato para escolherem a amazona mais forte. Afinal de contas, o estranho não pode continuar na Ilha. E só uma delas pode levá-lo de volta pra sua terra, porém, uma vez saindo de Themyscira, nunca mais se pode voltar. E esse alguém, como sabemos, é Diana, a própria filha da Rainha. Esse começo na Ilha é muito legal e bonito, a arte de Nicola Scott (Novos Titãs) é muito boa, cheia de detalhes que fazem a diferença, como mostrar uma diversidade étnica entre as mulheres, além da física: todas as guerreiras são musculosas. Saindo um pouco daquela velha fetichização de mulheres guerreiras de calcinha e sutiã. Um outro ponto muito interessante é a questão da homossexualidade na Ilha, algo que foi polêmica ano passado. Num lugar onde só há mulheres, não é de se surpreender que as relações afetivas serão entre elas. Claro, nada é muito explícito. Talvez para não causar maiores controvérsias, Greg Rucka preferiu tratar tudo nas entrelinhas, mas a própria Diana possui uma “amiga” de nome Kasia.
Na segunda parte do arco, Diana chega nos EUA e passa a ser investigada por Etta Candy, além de ganhar seus poderes (força, voo, agilidade…) de maneira divina. Também gostei por tudo ser bastante realista na medida do possível. A língua é uma barreira: ninguém entende o que ela fala e ela não entende o que todo mundo fala. É aí que surge Barbara Ann Minerva, uma especialista em culturas antigas e que vinha pesquisando sobre a Ilha das Amazonas, sendo a única que consegue falar o idioma. A edição 8 é focada nela, inclusive, mostrando desde sua infância, como uma garotinha genial e poliglota, até a idade adulta, se especializando em arqueologia e viajando o mundo em busca de provar que as amazonas são reais. Essa edição é desenhada pela Bilquis Evelyn (Shaft), ótima. Eles também descobrem um modo de se comunicarem, de passarem a entender a língua um do outro, e a maneira como é feita é bem legal.
Assim como no primeiro arco, este segundo mantém a mesma ideia de apresentar a Mulher-Maravilha pro grande público, colocando todas as suas principais características nessas primeiras 14 edições. Isso, claro, implica em não trazer tantas novidades. Achei As Mentiras um tanto genérico, mas este Ano Um trouxe pontos mais interessantes, por mais que seja a velha história de como ela saiu de Themyscira. Há até um clima nostálgico, em como a equipe de Etta passa a enfrentar o grupo SEAR (e para quem trabalham), como as histórias da Era de Ouro dos heróis, com problemas sendo resolvidos de última hora. Apesar de ocorrer no tempo atual, traz essa ingenuidade e beleza das histórias antigas. Com o bônus de não ter aqueles milhares de balões de pensamento. E ainda com desenhos super bonitos. Um outro ponto que tira a história de seu lugar comum é em como o autor está incluindo questões de orientação sexual. A Diana comenta sobre Kasia para Steven num dado momento, sem nenhum peso de julgamento. Etta e Barbara também fica no ar se possuem interesse uma pela outra, tudo muito bem construído. E como as histórias correm em paralelo, também é legal perceber como a Diana aqui é bastante inocente, conversando com animais e tudo; enquanto no presente ela está perdida em si mesma, sem saber como voltar pra casa e questionando tudo.
(Steve Trevor também não faz questão de ficar descamisado em boa parte das cenas. Good).
Fil Felix é autor, ilustrador e psicanalista. A Central dos Sonhos é seu universo particular, por onde aborda questões como memórias, desejos e infância. Fã de HQs, escreve seus comentários sobre quadrinhos desde 2011, totalizando mais de 600 reviews. Já escreveu sobre arte para diversos blogs como Os Imaginários e a coluna Asas da editora Caligo. Ilustrou os livros infantis Zumi Barreshti (2021, Palco das Letras) e Meu Avô Que Me Ensinou (Ases da Literatura), entre outras publicações.