Arcos Principais: Noite dos Homens-Monstro (Night of the Monster Men).
Publicação Original/ Brasil: Batman #7-8, Detective Comics #941-942 e Nightwing #5-6 (DC, 2016)/ Inédito.
Roteiro/ Arte: Steve Orlando/ Riley Rossmo, Roge Antonio, Andy Macdonald.
Em maio de 2016 a DC lançou o evento “Rebirth“, reiniciando todas as suas séries, mas sem ser um “reboot“. A Noite dos Homens-Monstro (Night of The Monster Men) é o primeiro crossover desta fase e ao mesmo tempo o segundo arco das séries Batman, Detective Comics e Asa Noturna. Crossovers não tem boa fama, pois geralmente são feitos pra vender e alavancar séries menos populares, pegando carona em títulos mais fortes. Este review comenta o arco, sem spoilers, ainda inédito por aqui. Pra saber um pouco mais sobre essa proposta da DC, só dar uma conferida nos especiais do primeiro arco de Batman: Eu Sou Gotham e Detective Comics: Ascensão dos Homens-Morcego.
Steve Orlando (Batman & Robin Eterno, Meia-Noite) é o roteirista principal deste crossover, trabalhando em conjunto com os autores de cada revista, intercalando as histórias. Ou seja, não adianta ler só o que está na revista do Batman ou só na do Asa Noturna, tem que ser lido na sequência certa (BM #7, AN #5, DC #941, BM #8, AN #6 e DC #942). O grande diferencial de Noite dos Homens-Monstro é tirar o Batman de sua zona de conforto, do clima sombrio e noir de suas histórias, dos vilões perturbados; e levá-lo para uma zona mais tecnicolor, monstros gigantes e com seu papel de líder sendo questionado. É um giro e tanto, que certamente irá desagradar muitos leitores. Por outro lado, esse clima traz uma vivacidade maior aos personagens.
Na história, que foi sendo trabalhada nos primeiros arcos das três séries, traz de volta o vilão psicólogo e cientista Hugo Strange, numa versão mais recauchutada. Numa das primeiras cenas em que aparece, por exemplo, ele é mostrado de costas, bunda à vista e levantando peso. Ele utiliza de um vírus para infectar o cadáver de 4 pessoas que já estiveram envolvidas com ele no passado, afetando esses corpos e os transformando em 4 monstros gigantes que passam a detonar Gotham, causando pânico e destruição. Ao mesmo tempo, a cidade está recebendo uma de suas piores tempestades.
Batman, Batwoman e Asa Noturna reúnem o restante da família (Salteadora, Cara de Barro e Orfã) para planejar como irão deter os monstros e salvar as pessoas da enchente. Assim, Saltadora e Ninja ficam responsáveis por levar a população para uma caverna bem acima do nível do mar; Cara de Barro se divide em vários para auxiliar a polícia; enquanto os outros tentam acabar com os monstros. Um dos pontos, já nesse início, que podemos perceber é que o Batman quer proteger sua família a todo custo, principalmente com a “morte” do Robin Vermelho em Ascensão dos Homens-Morcego. Ele quer tirar os outros de zonas de perigo, mas quase todos o desobedecem. Batwoman, sendo mais sensata, pede para que ele confie no treinando de seus “alunos”.
O plot principal é este, a batalha com os monstros gigantes. Mas os detalhes fazem toda a diferença. Começando por esses vilões, que fogem totalmente do normal em Gotham. O próprio Batman diz que não é algo com que ele (e sua família) estão acostumados a lidar. Esses monstros parecem os Kaijus japoneses, aqueles monstros gigantes que surgem da Terra ou espaço (como o Godzilla) e que são comum nos Tokusatsu, os live-actions com esquadrões multicoloridos (como os Power Rangers). E tudo leva a crer que esta foi a maior inspiração do autor. O clima deste arco beira o absurdo, mostrando um Batman exagerado e tecnologias que chegam a ser cômicas. Num momento, Batwoman, Asa Noturna, Salteadora e Ninja entram na “arma secreta” de Gotham: 4 torres que possuem um super-arsenal, controladas por dentro por cada um dos heróis. A sequência é praticamente a montagem do Megazord dos Power Rangers. Apesar de não formarem um robô gigante (seria muito óbvio), o esquema ainda é semelhante. Não é de se espantar que Steve Orlando é um dos autores da revista mensal dos Power Rangers pela editora BOOM.
Apesar de não carregar o lado mais realista das histórias do Batman (e geralmente crossovers não são bons, também), este arco possui um charme próprio. Os artistas envolvidos são fenomenais, mantendo uma qualidade visual acima da média, principalmente pelas cores, que é a “cara” deste arco: tudo muito saturado, abusando das cores primárias (azul, vermelho e amarelo) e com tons de roxo absurdos. A Batwoman, como sempre, é um ícone fashion. Riley Rossmo (Cowboy Ninja Viking) é o desenhista de Batman, com as cores de Ivan Plascencia (Wolf-Man). Dupla sensacional, com direito aos pontos “menos reais” (como uma seringa gigante) e criando um monstro-bebê-gigante show. O momento em que aparecem o Batman e a Batwoman, você já sabe que vem coisa boa por aí.
Roge Antonio (Batgirl e as Aves de Rapina Rebitrh) desenha Asa Noturna, com as cores de Chris Sotomayor (Ms. Marvel), priorizando as lutas mais megalomaníacas, mas um pouco mais contido que Rossmo, sem tantos detalhes. As cores mantém o estilo tecnicolor de Plascencia. Já Andy MacDonald (American Terrorist) desenha Detective Comics, com as cores de John Raunch (Invencível), continuando colorido, mas menos saturado que os demais. Todas as duplas são ótimas, mas com destaque para Rossmo e Plascencia. A personagem Gotham Girl também tem uma participação especial com seu novo visual, agora de cabelo curtinho e meio insana. Talvez se torne uma heroína fixa na bat-família.
A Noite dos Homens-Monstro não é um arco surpreendente, com uma história profunda e que irá reverberar pelo tempo. Mas com certeza é algo distinto do que estamos acostumados a ver acontecendo em Gotham. Apesar de começar muito bem, ela perde um pouco do fôlego perto do final, quando os monstros passam a ser mais do mesmo. O Cara de Barro avisa a todo momento que pode entrar em colapso por ter se dividido tanto, mas é algo que morre na praia. Alguns dos momentos mais exagerados, como a formação Megazord, entra na tal da licença poética e se encaixa com o todo mais trash e psicodélico (que eu gosto bastante); outros ficaram tosco mesmo, como um holograma do Batman que surge em todas as luzes da cidade. Para o bem ou para o mal, é um arco divertido, incomum e com uma ótima arte. Vale a leitura, principalmente por mostrar Hugo Strange com um possível novo status quo ao final. Vale comentar que os monstros de Strange são conhecidos de longa data, houve até um especial em 2005 chamado Batman e os Homens-Monstro escrita e desenhada pelo Matt Wagner (Madame Xanadu), onde trata de suas criações monstruosas.
Fil Felix é autor, ilustrador e psicanalista. A Central dos Sonhos é seu universo particular, por onde aborda questões como memórias, desejos e infância. Fã de HQs, escreve seus comentários sobre quadrinhos desde 2011, totalizando mais de 600 reviews. Já escreveu sobre arte para diversos blogs como Os Imaginários e a coluna Asas da editora Caligo. Ilustrou os livros infantis Zumi Barreshti (2021, Palco das Letras) e Meu Avô Que Me Ensinou (Ases da Literatura), entre outras publicações.