[Conto] A Loja dos Sonhos !

#Esse conto faz parte da Central dos Sonhos, para conhecer o projeto leia Bem-Vindo à Central dos Sonhos. E para entender a Pandora leia Pandora: a Droga Onírica.

A Loja de Sonhos Conto

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Há um estalo no momento em que dormimos e passamos a sonhar. Um rápido estalo, seco e árido. Imperceptível. Impossível de lembrar. Quando se dá conta, já se encontra numa das infinitas salas do sonhar, reavendo lembranças ou experimentando sensações proibidas. Alguns, se tiverem sorte, vão mais a fundo no inconsciente, lúcidos. Até à Central dos Sonhos.

Em alguns casos, entretanto, nesse rápido estalo, a mente se depara com a Loja dos Sonhos, um local do subconsciente capaz de lhe entregar o que quiser.

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Mario está num divã, passando por uma hipnose induzida. Utilizando da técnica certa, o psicólogo travou a mente dele na Loja dos Sonhos. Conseguirá retirar de lá tudo que deseja saber, realizará a famosa regressão.

A Loja, na verdade, é uma alegoria. Ao final do corredor de um prédio velho, desses com as paredes desbotadas, há uma porta. Ao ser aberta, a Loja toma forma e entrega à mente o que ela deseja.

O consultório já não está com Mario, não mentalmente. Ele não sabe ao certo o que está fazendo, mas por impulso gira a maçaneta da porta e adentra a Loja. Um turbilhão de símbolos surgem, informações de uma vida. O rapaz é tomado por uma euforia nunca antes experimentada. A porta, então, é fechada.

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A Loja de Sonhos Conto 2 David Teniers

Do outro lado ele encontra algo inesperado: o jardim de um sobrado antigo. Algumas pessoas estão conversando próximas à porta, parando imediatamente ao vê-lo.  O medo de ser observado toma conta dele, que recua um pouco. Para a sua surpresa a porta da Loja desaparecera. Seria esse o teste que teria que passar? Enfrentar seus pavores? O medo das pessoas, de ser julgado, de estar sobre os olhos de uma multidão?

A sensação de lucidez se mescla ao onirismo. Uma parte dele reconhece o sonho, mas a outra passa a acreditar no local, que lembra muito sua casa de infância. Poderia afirmar que o sobrado era exatamente a casa onde crescera, talvez as pessoas ali paradas na porta fossem parentes, por saber, de alguma forma, que os reconhecia.

Surge do jardim um boneco de concreto, um desses anões utilizados para decoração. Com gorro e tudo. Ele se move em direção a Mario de forma surpreendente, já que deveria rachar ao movimentar suar pernas.

O anão segura uma das mãos de Mario, que aceita a situação facilmente, devido o pânico gerado pela casa. “Vamos entrar”, ele diz. Mario percebe uma certa similaridade na voz do  boneco, talvez seja seu psicologo personificado. Os dois caminham em direção a porta, apesar de receosos. As pessoas apenas observam, como que surpresas, mais ainda que o visitante inesperado.

Giram a maçaneta e entram.

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Um pouco mais afundo na mente de Mario, o psicologo tenta com a regressão combater a síndrome do pânico que seu paciente sofre. Encontrar a raiz de seus problemas. Talvez confrontando o “inimigo” cara a cara. Ele continua a passar informações através da hipnose, obtendo respostas e trabalhando em cima delas.

A Loja de Sonhos Conto 1

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Dentro do sobrado, pouco arejado devido as janelas trancadas, um cheiro de mofo pairando no ar e uma visível poeira flutuando pelos poucos raios de luz. Se sente sufocado pela sensação de desconforto. O boneco de concreto ao seu lado, porém, o puxa pelo braço, trazendo-o de volta à seu misterioso objetivo.

Mario perambula pelo local, toca os móveis e paredes. Sua consciência está cada vez mais se distanciando do sonho e se aproximando da realidade. Algo que, na verdade, seu psicólogo não quer. A terapia de regressão serve para dar respostas ao paciente, nunca de forma traumática.

Quando está prestes a subir as escadas, procurar por um quarto, alguém bate na porta. Ele, de início, apenas olha para trás, mas as batidas se tornam mais fortes. Seu coração volta a pulsar rapidamente. Também estão batendo nas janelas. Seriam as pessoas que estavam no lado de fora? A casa toda estremece com as pancadas.

Na dúvida entre ficar ou fugir, Mario segura o boneco e foge para o andar de cima. Ao certo, não sabia nem do que estava fugindo, mas seus instintos falaram mais alto. Entra num quarto da direita, como se já conhecesse o lugar. Tranca a porta por dentro e fecha as janelas. As batidas, porém, passam a ser nesse cômodo, agora.

Ele senta no chão, assustado. Abraça o anão com força, fecha os olhos. Escuta apenas a porta e janelas sendo arrebentadas e o barulho de uma multidão. Tem medo de ver o que é. Sente em seus braços o boneco quebrar. Mesmo assim se apega aos pedaços.

A multidão o cerca, o sufoca. Mario, num último momento de desespero, grita. O mais alto que pode. Sua boca escancarada, emitindo o mais grave dos medos, suga todo o seu redor. E num flashback ele fecha a porta do corredor antigo. Instantaneamente é transportado para o divã.

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A regressão falhara. O paciente não soube lidar com suas memórias e com o próprio medo. Nem a simbologia dentro do sonho o auxiliou. No entanto, a Loja dos Sonhos lhe entregou tudo que precisava naquele estalo original.

A Loja de Sonhos Conto 3

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