[Review] Rê Bordosa – Do Começo ao Fim !

 

Editora/Ano: L&PM, 2006
Preço/ Páginas: R$13,00/ 160 páginas
Gênero: Comédia/ Tiras
Roteiro/ Angeli: Angeli
Sinopse: Apesar de sua breve presença – de 1984 a 1987 – nas páginas da Folha de S. Paulo, onde surgiu e de onde se multiplicou por mais de 30 jornais do país, e de sua atuação como uma das protagonistas da revista Chiclete com Banana, a personagem criada por Angeli marcou época. Virou peça de teatro, foi capa de revistas e tema de baile de carnaval. Ganhou o prêmio de pin-up do ano de 1986 e deixou uma legião de viúvas e viúvos quando foi assassinada pelo autor em 1987. Neste livro estão reunidas pela primeira vez as tiras que narram a sua tresloucada trajetória: a vida, a obra, a morte e as memórias de Rê Bordosa enfim ao alcance do leitor, como um copo de vodca ao alcance das mãos da velha junckie.
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Rê Bordosa é uma das personagens mais carismáticas e conhecidas do cartunista Angeli, criador de figuras como o punk Bob Cuspe, os velhos hippies Wood & Stock, a ninfomaníaca Mara Tara, os pestes dos Skrotinhos e por aí vai. De todos eles, talvez a “velha junkie” tenha sido a que mais deu dor de cabeça ao autor, pois saiu do controle e estava quase andando sozinha, se tornando maior que o próprio Angeli que, num dos casos mais famosos das HQs nacionais, matou sua própria cria.
 
Neste livro de bolso da L&PM estão reunidas quase todas as tiras da personagem: as originais de 1984 à 1987, quando Rê Bordosa nasceu e morreu; e o especial Memórias de uma Porraloca, de 1995, mostrando os diários perdidos da junkie. É uma edição simples, seguindo a linha “pocket” da editora e por um preço acessível. O formato de leitura pode ser estranho no começo, pois as tiras estão dispostas na vertical, sendo necessário ler o livro “deitado”, virando as páginas de baixo pra cima. 
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Para quem não conhece, Rê Bordosa surgiu nas páginas do jornal Folha de S. Paulo, migrou para a revista Chiclete com Banana e ganhou o país. Nas suas tiras, o autor explorava uma mulher independente, sem medo de fazer tudo aquilo que lhe achava certo, sem pudores, sem tabus, sem nada! Sua vida era resumida na mesa de um bar. Viciada em vodka, cerveja, cigarros e, por que não, em algumas drogas, “Rê” também era viciada em sexo. Dentre uma ressaca e outra, refletindo em sua banheira, ela se aventurou nos mais diversos tipos de homens e mulheres, desde taxistas e garçons ao síndico do prédio e amigas de boteco; todos passaram por suas mãos. Suas atitudes inspiraram toda uma geração e o jeito “Rê Bordosa de ser” ficou amplamente conhecido. Apesar de ter a década de 1980 como pano de fundo, retratando muitos das questões sociais do período, as tiras de Angeli são contemporâneas e não envelheceram. Os jovens de hoje em dia se identificarão com as situações inacreditáveis passadas pela protagonista, principalmente para aqueles mais chegados num bar. Adorei uma das primeiras tiras, quando Rê lembra de todos os sintomas da ressaca, menos do quarto onde está (hehe).
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Temendo que a criação ultrapassasse o criador, Angeli decidiu matá-la em 1987. A notícia chegou a ser manchete de alguns jornais, mas ele não voltou atrás e a matou mesmo assim. O “caso Rê Bordosa” sempre vem a tona quando o autor é entrevistado e, mesmo agora, mais de 20 anos depois, ele não se arrepende do ocorrido. Além da personagem sair do foco principal, Angeli estava ficando “preso” à ela, como se a criação de novas tiras fosse uma obrigação. Ele não queria se tornar um autor de “um personagem só”, como Schulz (Peanuts) ou até mesmo Mauricio de Souza (Turma da Mônica) e cometeu o assassinato.
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Na primeira parte de “Do Começo ao Fim” temos quase todas as tiras publicadas entre 1984 à 1987. Apesar de poderem ser lidas isoladamente, elas seguem uma “cronologia”, passando por alguns “arcos” de histórias. Assim, podemos perceber a evolução tanto da história de Rê Bordosa quanto o traço do artista. Em meio à bebidas, cigarros e sexo, dona Rê reflete sua vida em sua famosa banheira, olhando o espelho, na cama ou na boa e velha mesa de bar, com seu fiel garçom Juvenal. Nesses quase 4 anos de tiras, tudo que podia acontecer na vida da junkie aconteceram: suas consultas à um psicanalista; a visita de seus pais; seus inúmeros casos; seu primeiro “namoro”; sua participação num talk show; as tentativas de suicídio; as merecidas férias; as broxadas; a tentativa de assassinato por Angeli; sua fuga; a tentativa de virar freira; até mesmo um casamento; e, finalmente, sua morte. Sem contar os temas mais polêmicos, como seus abortos; sua bissexualidade; e como reagiu com o “boom” da AIDS na década de 1980.
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Na segunda parte do título temos as tiras do especial “Memórias de uma Porraloca”, publicado originalmente em 1995. Na ocasião, Angeli não ressuscitou a personagem, e sim fez uma coletânea do que seria os diários de Rê Bordosa, com alguns de seus casos mais incríveis. Contado de forma diferenciada, temos um Angeli-personagem encontrando uma antiga pasta cheia de anotações, rascunhos e desenhos que ele não lembra de ter criado. Lendo-as, percebe se tratar de anotações da própria Rê Bordosa. A arte deste especial está diferente, mais refinada e polida, o autor também explora outros ângulos e cenários, além de incluir recordatórios, inexistentes na série original. Mesmo assim, o humor não é igual, apesar de continuar engraçado.
 
Rê Bordosa – Do Começo ao Fim é um ótimo título por reunir, num único volume, quase todas as tiras da porraloca. Porém, a L&PM deixou escapar algumas coisas. Poderia ter um editorial, alguns textos explicativos ou algo do gênero, para familiarizar melhor o leitor, além da ausência das datas originais de publicação, fica difícil saber quais tiras foram lançadas em jornais, quais saíram em revista, etc. A Cia. das Letras anunciou que irá publicar uma versão definitiva da personagem, intitulado “Toda Rê Bordosa”, reunindo as tiras, textos, etc. Enquanto isso, esse pocket funciona muito bem aos fans.
nota 9,0 o
*Para quem interessar possa: Junkie é um termo utilizado para representar pessoas com um estilo mais “undergroud” de ser, não raramente viciado em drogas e álcool.

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